Tinha que ser assim

Todos os dias ele acorda e seu rosto marcado de travesseiro denuncia a noite profunda de sono. Seus sonhos são povoados de pequenas loucuras, mas são sonhos. Como uma licença poética da qual o cérebro se vale para rasgar as neuras e os medos em pedaços. Com um pulo levanta da cama, toma um banho rápido, escova os dentes rápido, arruma os cabelos rápido. Os olhos vermelhos ainda de sono dão o contraste ao verde profundo da iris matutina.

Toma seu café. Ouve vozes, muitas vozes. O sono é maior que as vozes que ouve. Mãe falando, pai falando, irmãs. Mas no fundo ele não entende nada. Só ouve. Tudo que se dirige a ele recebe respostas monossilábicas. Não tem muita paciência pela manhã, prefere o silêncio.

Espera passar o dia. No trabalho, sempre uma boa história, que rende uma boa risada.

Volta para casa, família reunida, jantar, discussão. Será que é isso que ele queria?

Mas no fundo, hoje, se sente melhor. Se sente mais próximo do que deseja. Cada passo é pensado para o futuro. Diferente do passo de ontem, que era mais curto. Agora se deixa sonhar, se deixa sorrir. Não se incomoda com o pouco, apenas se entristece com o pouco. E quer melhorar ainda mais.

E sabe que tem alguém que o ama. Alguém que lhe quer bem, e isso lhe faz bem. Fazer o bem para o outro lhe faz bem. Dividir a vida com o outro lhe faz bem.

Se tinha que ser assim, não se sabe. Mas é assim, e assim será.