A avalanche tecnológica na qual vivemos suscita muitas perguntas sobre os rumos que a cultura poderá tomar com a realidade giga- e terabáitica que se apresenta, transformando relações sociais e econômicas. Uma delas, hoje feita pelo caderno Link do JornalÃO, já é uma velha conhecida nossa: os livros de papel vão acabar frente às novidades informáticas que estão por aí? Diversos especialistas, autores e leitores dão sua opinião na matéria, comparam com a indústria fonográfica que passa por dificuldades por conta da pirataria. Proponho um pensamentozinho diferente do imediatismo da matéria, no qual me remeto à história dos livros x história dos discos.
A literatura e os livros de papel sempre existiram como forma de representação da realidade. por mais fantástico que possa ser seu conteúdo. O suporte "papel" é, ainda, o mais confiável quando se trata de documentação (do contrário, já teríamos chips apenas com nossas informações e documentos, sem precisar de papelada para isso ou aquilo). Mais do que nunca, ao menos em terras brazucas, se consomem livros, ainda em proporção pequena, mas muito maior do que antigamente. Já o suporte "disco" é recente na história da humanidade, ainda mais o CD, um recém-nascido se comparado aos volumes encadernados. Porém, a indústria fonográfica (pela facilidade de consumo inclusive) perde milhões pela pirataria e por não ter alcançado o ritmo internáutico do mundo de hoje.
É possível, até plausível, que haja um aumento do consumo de literatura digital nos próximos anos, visto que já existente leitores eletrônicos (e-readers) no mercado (como o Kindle, da Amazon, e o Sony Reader), que possuem tela fosca e tentam reproduzir o papel na tela. Trazem a facilidade de armazenar diversos livros (200 em média) em seu disco rígido, ser fácil de carregar etc. Num país como o Brasil, admitamos, ainda é difícil perambular com um treco desses na rua sem ser assaltado e, no caso de assalto, ser posteriormente amaldiçoado pelo ladrão que perguntará: "pra que serve essa porra?".
Além disso, há o apelo emocional. Discos de vinil tinham esse apelo também, mas o CD se tornou um material tão barato, tão descartável e banal que não há como se apegar ao disquinho digital (salvo exceções, claro). A experiência de ter um livro nas mãos, folhear, brincar com ele, escrever, fazer anotações e, no auge da loucura (como um autor francês fazia), rasgar as páginas que não aprecia ainda é privilégio do papel. Tê-lo na estante depois de lido, reler com o carinho e as impressões da leitura anterior, com as manchas de café, gordura, chuva etc. fazem do livro quase um ser vivo, um amigo, um companheiro fiel. Coisa que fica difícil com telas, chips e afins.
Acredito, sim, na interatividade (pois também sou apaixonado pela tecnologia), no livro que ultrapassa as barreiras do suporte de papel e se integra à Internet para que a obra não se esgote (como o livro do Nelson Motta sobre o Tim Maia, que interage com um site com muito material e a iniciativa virtual da editora inglesa Penguin e da Six to Start chamado We tell stories). Porém, acho que o livro em papel, do jeitinho que a gente conhece, ainda sobreviverá por muito tempo.