Pedras Frias de Paraty

Passeava tranqüilo pelas ruas pedregosas de Paraty, sentindo a brisa sorrateira que abruptamente fazia voar folhas e poeira. Vozes ecoavam límpidas por aqueles corredores de casarios antigos e o sereno deitava sua mão fria pelos ombros dos passantes. Verdade que já estivera ali muitas vezes, testemunhando o desabrochar das rosas próximas à igreja de santa Rita e o suspiro apaixonado dos enamorados sob as árvores da praça em frente à Matriz. Já era quase dia e o vermelho vivo da manhã engolia sem trégua os restos da mortalha da noite por trás das montanhas. Uma ponta de angústia o tomou de pronto quando uma cigana perdida naquela manhã tomou sua mão de assalto e perguntou, sibilante: “Quieres saber tu futuro?” Ele, que nunca acreditara nem em zodíaco nem em futuro, sorriu debochado e perguntou “E quanto me cobras cigana, pelo meu futuro?” Ríspida tirou a mão de entre os grandes dedos do rapaz, virou as costas e rumou para o canal. Sem entender, correu atrás da moça de cabelos negros: “Ei, espere, aonde vai?” , perguntou agarrando o braço da mulher. “Non te gustaria saber. Intenso, difícil lo que tengo a te decir. Vale, solta-me.” Desolado, ele deixa a cigana seguir seu caminho, aguardando que se acalme para procurá-la novamente e saber que há em seu futuro. Quando some de vista a cigana e o moço segue seu sem-rumo pela alvorada que irrompe quente, ouve um estampido, atípico. Corre para ver o que há, dois moleques se esgueiram pelos becos. Encontra, de cócoras e sangrando muito, a cigana. O grito por socorro ribomba pelos peitoris de janelas fechadas. As últimas palavras que consegue ouvir da cigana são “Busca, busca...”.
(Exercício feito na oficina de inverno passada, do Curso de Formação de Escritores, proposto pelo querido Julio. Foram 12 palavras e um conto foi feito. As palavras foram abruptamente, vozes, sereno, verdade, suspiro, manhã, angústia, zodíaco, intenso, estampido, atípico.)