Contraparte
Oito e oito da noite, entro no metrô apressado. As hordas paulistanas arrastam meu corpo. Sem me entregar a elas, sigo até os degraus da escada central, deserto no meio da multidão.
"Eu te vejo sumir por aí / Te avisei que a cidade era um vão / Dá tua mão, olha prá mim / Não faz assim, não vá lá, não"
Chico me embala em sua voz doce e o leve trotar na escada me leva para muito longe; súbita a sensação de acalanto no meio do vozerio que se instala. O calor úmido me envolve, íntimo. Alheio, espero que meu corpo seja levado. Olhos me observam, meio de relance. Não são olhos, são pequenos traços que me encantam. Eu os conheço.
"Já te vejo brincando gostando de ser / Tua sombra a se multiplicar / Nos teus olhos também posso ver / As vitrines te vendo passar"
Não consigo alcançar o olhar. Tenho a ânsia de voltar, correr, alcançá-la. E o que fazer em seguida?
Talvez não seja a hora. Chego na plataforma, com um sorriso bobo no rosto. As pessoas me olham incrédulas, mal-humoradas. Ouço o trem chegando devagar. E sinto a carícia do vento; carícia que aguardo daqueles olhares pequenos de gueixa.
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